A VIDA OCULTA DE JESUS
São muitas as teorias acerca da vida oculta de Jesus, no período compreendido entre os doze anos e o início de sua vida pública, aos trinta. Não há nada na Bíblia que sinalize o modo como Ele viveu aqueles anos, por isso, muito se especula até hoje sobre eles.
Por trás destas teorias está o compreensível escândalo de Nazaré. Assim diz o Evangelho: "De Nazaré pode sair algo de bom?" (Jo 1,46). Existem duas desproporções possíveis: quando se tem fé e quando não. Se não se tem fé e não se crê que Jesus é Deus que se fez homem, mas tão somente um grande profeta, um sábio, um iluminado, um grande líder religioso da humanidade, instala-se a desproporção de causa e efeito, pois Nazaré, sendo um vila muito pequena e humilde, não poderia ter dado ao mundo tão grande e importante sábio. Jesus teria que ter aprendido ou adquirido a sua grande sabedoria em outro lugar que não Nazaré.
Quando se tem fé e realmente se acredita que Jesus é Deus não há o problema da causa e efeito. A sua sabedoria ele a trouxe do Alto. O escândalo se torna o desperdício, pois Jesus sendo quem é – o Salvador – parece ter despediçado anos de sua vida fazendo cadeiras, mesas, portas, trabalhando numa carpintaria, sem nada dizer, enquanto o mundo todo precisava ser salvo.
Contudo, neste escândalo existe uma grande luz. São Josemaría Escrivá, fundador do Opus Dei, na homilia pronunciada no dia 24 de dezembro de 1963, publicada no livro "Cristo que passa", diz:
"por muito que tenhamos pensado nessas verdades devemos encher-nos sempre de admiração ao pensar nos trinta anos de obscuridade que constituem a passagem da maior parte da vida de Jesus entre seus irmãos, os homens. Anos de sombra, mas para nós, claros como a luz do sol, resplendor que ilumina o nosso dia e lhes dá uma autêntica projeção, pois somos cristãos correntes com uma vida vulgar igual a tantos milhões de pessoas nos mais diversos lugares do mundo."
O Santo está dizendo que, ao viver a vida ordinária, comum, do dia a dia, Jesus iluminou a vida de milhões de pessoas. Que Deus, o Criador do Universo, das galáxias, dos anjos, o Sábio dos sábios, o Onipotente, a Luz da luz, tenha se transformado numa pequena vela, bruxuleando na noite de uma pequena vila no interior da Palestina, na periferia do mundo, pode sim soar como um grande escândalo, mas para muitos é um grande farol que ilumina e significa que a vida desses milhões de pessoas tem dignidade.
A vida ordinária, de trabalho, de luta é fonte de grande santificação para todos os homens porque Deus viveu essa mesma vida. O Papa Paulo VI, em Nazaré, no dia 05 de janeiro de 1964, pronunciou um importante discurso até hoje recordado pela Igreja. Nele, o Papa recorda as três lições de Nazaré: silêncio, vida familiar e trabalho.
A Palavra de Deus se fez carne e silenciosamente viveu em Nazaré. Saber ouvir, viver como aquele que escuta Deus. Jesus é a Palavra de Deus, mas viveu anos em Nazaré escutando as coisas de seu Pai.
A vida familiar foi infinitamente dignificada quando Jesus viveu com sua mãe, Maria e o seu pai adotivo, José, na obediência e submissão, que mais tarde seriam repetidas de forma extraordinária no Horto das Oliveiras e na Cruz.
Finalmente, o trabalho, que não é meramente um castigo do pecado, como bem intuiu São Josemaría Escrivá ao ler o livro do Gênesis, pois, mesmo antes do pecado original, Deus havia colocado o homem no paraíso para cultivar o jardim. Portanto, o trabalho estava inserido no projeto divino para o homem. O homem como co-criador, como participante da criação divina.
Com todas essas lições ensinadas por Jesus, o silêncio de Nazaré se torna eloquente, muito mais que um discurso: se torna vida que dá vida ao homem. Portanto, não há que se preocupar em tentar explicar ou entender o mistério da vida oculta de Jesus, do suposto desperdício, Ele não se desperdiçou em sua vida em Nazaré, assim como cada homem ao longo do tempo não desperdiça a própria vida vivendo a fidelidade a Deus no dia a dia, em sua vida ordinária, no seu trabalho, na sua Nazaré.