Canto Gregoriano

PAOLA MARIA BOTTO FARHAN: HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

Paramentos Litúrgicos

1 – Introdução

O termo “medieval” vem da expressão latina “medium aevum” (época intermediária) dada pelos historiadores renascentistas ao período compreendido entre o desaparecimento do Império Romano e os novos interesses pela cultura greco-romana no século 15. O regime sócio-econômico predominante foi o feudalismo, caracterizado pela exploração da terra e por uma complexa hierarquia político-militar entre as pessoas. Este regime dividiu a Europa em minúsculos territórios. O fator de coesão era a Igreja Católica que, de fato, decidia o destino de todos.

É um engano qualificar este período como a “Idade das Trevas”: ao contrário, a sua rica produção cultural sintetizou os conhecimentos greco-romanos, germânicos, árabes, judaico-cristãos, bizantinos, etc., manifestou-se em todas as áreas artísticas (arquitetura, marcenaria, artes visuais como pintura, escultura, vitrais, iluminuras etc., literatura como canções de gesta, romances de cavalaria, baladas, fábulas etc.) e continuou a investigar os princípios da ciência e da filosofia. Os seminários e conventos mantiveram gigantescas bibliotecas. Enfim, este período, mesmo com suas guerras, epidemias, fanatismos, misticismos, etc. preservou a civilização humana na sua integridade. O campo musical nos dá uma pequena mostra da riqueza cultural do período.

2 – Música religiosa medieval

As músicas mais antigas, que podemos executar com muita fidelidade, são os cantos gregorianos criados para o culto católico.

Da música cristã primitiva só nos restam os poemas, mas, mesmo assim, os pesquisadores percebem que a origem dos cânticos era muito diversificada:

• salmos e hinos religiosos dos judeus;

• canções profanas de outras culturas (Grécia, Roma, entre outras) adaptadas ao pensamento cristão

• criações próprias cristãs

Até o século 4, todos os fiéis participavam das várias cerimônias, cantando, batendo as mãos e os pés, dançando discretamente e até tocando instrumentos, tais como: harpa, saltério, órgão, trompete, sinos etc.

No século 5, a Igreja Católica, querendo uniformizar o seu culto em todos os lugares, tratou de desenvolver um estilo único e criar uma escritura musical exata. Para suplementar isto fundou a “Schola Cantorum”, em Roma, onde os padres-compositores deveriam estudar. A partir de então um coro profissional passou a exercer todas as funções musicais nas cerimônias. Instrumentos não eram mais permitidos, pois foram considerados pelo clero, como terrenos ou demoníacos, enquanto a voz humana foi valorizada por ser uma criação divina. Mesmo assim, algum instrumento era utilizado, com ou sem autorização dos religiosos, para sustentar a correta afinação do coro. Depois de muitos debates, o canto gregoriano foi oficializado no início do século 7.

2.1 – Ars Antiqua – séculos 7 a 13

A música medieval denominada “Ars Antiqua” (arte antiga) é aquela que abrange desde o canto gregoriano até a invenção do moteto, dos séculos 7 ao 13.

2.1.a – Características

A música religiosa deste período é estreitamente ligada ao canto gregoriano que serve de base para todas as composições. Sua sonoridade é muito diferente da nossa realidade, mas, também por causa disto, os cantos gregorianos nos envolvem, criando um clima de tranquilidade e as primeiras experimentações do organum nos aparecem como curiosidades experimentais e ruidosas. Nesta época criaram a terminologia musical (incluindo o nome das notas), criaram a grafia e desenvolveram as primeiras teorias musicais ocidentais.

2.1.b – Canto Gregoriano – século 7

Gregório I, papa entre 590 a 604, e outros compilaram, compuseram e organizaram vários poemas e canções, que foram reunidos nos livros:

− Graduale (cantos solos e corais para todas as festas católicas)
− Kyriale (cantos para as partes fixas das missas)
− Antiphonale (cantos, hinos e orações dos monges)

Esta música tem as seguintes características:

− é o canto oficial da Igreja Católica;
− o texto é em latim;
− a importância é dada ao texto e não à música (objetivo é propagar a fé e não fazer um recital);

deve ser cantado, obrigatoriamente, só por homens (mas recentes pesquisas em conventos, descobriram milhares de cânticos compostos e interpretados por mulheres);

− não pode ter acompanhamento instrumental de qualquer espécie;
− é prosódico (um tipo de canto falado);
− melodias simples com pouca mudança de notas e uma tessitura menor que uma oitava;
− monofônico (uma única linha melódica);
− diatônico (escalas sem alteração cromática ou microtonal);
− modal (escalas de sete sons, ligeiramente diferentes das nossas escalas);
− o ritmo depende das palavras, portanto é livre de fórmulas de compasso;
− não tem preocupação com a dinâmica;
− o andamento, geralmente, é lento;
− os compositores são anônimos, pertencentes ao clero.

A melodia do canto gregoriano depende da forma do poema e se desenvolve numa linha quase que infinita, descendo e subindo por graus conjuntos e com raros saltos intervalares. Ela tem caráter sereno e é uniforme em suas nuances.

Não havia um regente, apenas os ensaiadores ou professores de canto que regiam o grupo com o rolo da partitura, apelidado de “solfa” (uma espécie de brincadeira com os nomes das notas – e daí vem a palavra “solfejo”, treino melódico-rítmico). Escrevia-se a música com bico de pena de ponta quadrada e tinta em um rolo de pergaminho, de cor bege.

No século 19 esta música foi batizada, pelos monges de Solesmes (França), de “canto gregoriano”, em homenagem àquele papa. Também recebeu o nome de “cantochão” (“cantus planus” em latim) no século 13, para diferenciá-lo do “canto mensurado”, quando inventaram as figuras rítmicas.

Enviado por Paola Maria Botto Farhan – professora aposentada dos idiomas de francês e italiano.

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