O desabafo de um padre diocesano!
É muito ruim sentir “pena” de alguém, é o que costumam dizer… Afirmam estes que pena é um sentimento indigno de se sentir por alguém, que coloca esse alguém numa posição humilhante, quase que indigna de um ser humano…
Porém, não encontro um sentimento mais adequado para os sacerdotes seculares, particularmente os diocesanos.
Muita gente olha para o padre com compaixão: muitas vezes vive realmente na pobreza, não possui esposa, nem filhos etc. Mas tudo isso foi amplamente considerado por ele desde que percebeu os vislumbres da vocação. De tal modo, que as privações da vida sacerdotal não o assustam, como não deve assustar a um cirurgião ver sangue.
Mas, particularmente nos últimos anos, a situação dos padres diocesanos tem piorado e causado grandes dores a esses homens que nem em seus piores pesadelos podiam imaginar que passariam pelo que têm passado. Dentre várias situações, vou descrever algumas:
a) Papalatria: os padres diocesanos estão sendo postos numa posição em que precisam escolher entre a Igreja ou o Papa. Entre toda a doutrina e moral que o Senhor confiou à sua Igreja ou à febre demolidora de Francisco. A tal ponto que Francisco, conscientemente assumiu a postura de um outro Cristo capaz de dizer: “Ouvistes o que foi dito, eu porém vos digo”. Somente Deus poderia dizer tal coisa, ou um blasfemo que se sente deus. O padre diocesano que desposou a Igreja não reconhece mais o rosto da sua esposa e, por isso, é levado a crer que ela foi sequestrada e outra mulher, horrível, foi posta em seu lugar.
b) Episcopocracia: outro manancial de feridas e dores para os padres diocesanos é o autoritarismo dos bispos. Numa igreja sem fé e sem moral, quem governa são os homens e não Deus, portanto, não há mais mandamento nem dogma, há apenas a necessidade de agradar que se manifesta em cansativas expressões como “estar em comunhão”. Um padre hoje está (de um ponto de vista apenas imediato e material) completamente nas mãos do Bispo. Quando se tem um Bispo que pelo menos deixe que se seja católico, as coisas vão com certa tranquilidade; mas quando não, a vida do padre será tal que para continuar católico, aparentemente, terá que ser cismático.
c) Covardia fraterna: É claro que seus colegas (irmãos seria uma palavra forçosa demais e, na maior parte dos casos, uma mentira) não estão alheios a essa crise, e a combatem virilmente sussurrando nos corredores do retiro do clero… Mas são covardes, e num afundar de um navio os primeiros que fogem são os ratos. Esses padres não têm a vergonha de oscilar entre fé e heresia, entre a moral de situação e a moral católica, entre a batina e camisa polo. A meta de sua existência é agradar ao bispo, e esquecem que sendo o bispo um homem convém temer não a ele, mas Àqu’Ele que tem poder de tirar essa vida e de jogar a alma no inferno. Querem cargos, poder, prestígio, não para depô-los aos pés de Cristo Rei, mas para tomarem o lugar daqu’Ele a quem deveriam servir.
d) Democracia sinodal: Até alguns anos atrás não chocava aos ouvidos de ninguém ouvir que a Igreja não é democrática, mas hierárquica. Porém, quando muitos dos sucessores dos Apóstolos escolheram suceder unicamente a Judas, seguindo um modelo comunista, os Bispos criaram “conexões diretas” com certos membros do laicato que, num evidente clericalismo, muitas vezes tendo em vistas coordenações, prestígio e poder, poderiam movimentar boa parte do povo de uma paróquia no caminho que o Bispo desejasse, ficando o padre diocesano entre o mar e as pedras… Essas conexões diretas dos Bispos não são nada mais que informantes, que futriqueiras, levam-e-traz que são os responsáveis por dizer: “O Bispo não gosta do nosso pároco”; “O nosso pároco não segue as normas do plano pastoral”; “Sabiam que nessa semana nosso padre foi chamado na mitra?”.
É claro que nem todo o povo de uma paróquia está de acordo com o que é determinado pela hierarquia. Esses fiéis, verdadeiramente católicos não se opõem por causa de um gosto pessoal, mas quando as determinações ferem diretamente a doutrina, moral ou liturgia da Santa Igreja. Mas esses, mesmo imensa maioria, não contam. São negacio-nazi-fasci-terraplani- tradi-hiper-ultra-conserva-intole-homeschol-lefebri-tridenti-monforti-cedebistas.
e) Fantasma dos abusos: nunca serão suficientemente lamentados os abusos sexuais feitos por aqueles que deveriam inculcar o amor à castidade e à pureza. Mas hoje a palavra abuso, e isso é proposital, pode referir-se tanto a um estupro como a uma chamada de atenção (mesmo que serena e caridosa) que o padre deu à mulher que colocou os paninhos verdes, quando a cor litúrgica seria vermelha. E isso é feito para que simplesmente se possa qualificar aquele padre como “abusador” que, num inconsciente coletivo, será completado pela palavra “sexual”. Hoje se fala em tantas formas de abuso, que não se pode mais corrigir uma pessoa, chamar a atenção ou até mesmo fazer as perguntas necessárias para a validade de uma confissão.
E, retornando aos terríveis abusos sexuais, falta, mesmo na Lei Civil, determinar melhor não apenas as variações que podem ocorrer nesse crime, como o modo de conduzir o processo de forma que haja uma necessidade de provas materiais distintas dos depoimentos das supostas vítimas, o que, convenhamos, pode ser fonte de vários processos injustos e viciosos.
Dentro ainda dessa linha, é minimamente curioso que muitas vezes sejam exatamente sobre padres considerados tradicionais ou conservadores que se levantem esse tipo de acusação, sem (e não por falta de buscas) nenhuma outra prova que um ou outro relato contraditório.
Na lei do papa da misericórdia e da ternura, o simples fato que alguém diga que “acha que soube que viu num dia que não se lembra direito que” um padre cometeu um abuso já é motivo para suspender o padre e, se o bispo não o fizer, o bispo.
Ok. O que acontece com esse padre?
Ele não tem a estrutura de uma congregação religiosa ou convento para o abrigar. Voltará para casa da mãe, para viver de esmolas e tentar não se matar.
f) A impossibilidade de ignorar a hierarquia: durante décadas muitos padres optaram por fazer de conta que não viam os erros e viver uma vida ensinando o catecismo verdadeiro para as pessoas, celebrando piedosamente, vivendo “em comunhão”, mas sem “exageros”. Hoje isso é impossível. A quantidade de reuniões, assembleias, votações, declarações papais, motu proprios seguidos por orientações diocesanas, parecem ser um cabo de vassoura enfiado na toca de um animal que só queria permanecer quietinho e morrer em paz. É impossível a um padre hoje ficar isento. Ou rompe e permanece católico de verdade, ou permanece católico de mentira porque na verdade apostatou da fé. Achou complicada a frase anterior? É isso mesmo. Tão complicada como a situação atual.
g) Desconfiança tradicionalista: Alguém de fora poderia pensar que esses padres diocesanos encontrariam apoio nos fiéis ditos “tradicionalistas”, mas não é bem assim. Também ali, muitas vezes, esses padres encontram a frieza e a desconfiança. Muitos desses fiéis, levados por outros padres também “tradicionalistas”, questionam a validade dos sacramentos desse padre (até mesmo sua ordenação, em alguns casos); ficam atentos a um ou outro erro que possa cometer ao celebrar num rito que ama sem nunca ter visto; temem seus conselhos, uma vez que foi formado “no modernismo”; e, se dele se aproximam, é por não terem outra opção, mas sempre com desconfiança.
Enfim, essas são breves reflexões que escrevi num só fôlego, na esperança de que suscitem realmente pena, mas uma pena que leve à oração e, se possível, a alguma forma de apoio.
Pe. Mariano – 10.IX.2021