ENVIADO PELA CATEQUISTA MÔNICA ROMANO
Neste livro, que é publicado simultaneamente em muitas línguas, são apresentados os textos completos desse encontro, a propósito do qual muitos falaram de uma histórica mudança para a Igreja. Com efeito, as raízes da crise, que, por vinte anos, a partir da conclusão do Concílio, vêm sacudindo o cristianismo, são denunciadas com escandalosa clareza por um dos homens mais importantes do Vaticano. Trata-se de um relatório claro e firme acerca dos perigos que ameaçam a fé, vistos por quem diariamente recebe, de todos os continentes, as informações mais reservadas. O livro traz – Um encontro incomum; Um concílio a ser redescoberto; Nas raízes da crise – a ideia de Igreja; Entre Padres e Bispos; Sinais de perigo; O drama da moral; As mulheres, uma mulher; Uma espiritualidade para hoje; Liturgia, entre o antigo e o novo; Coisas do Demônio e escatologia; Irmãos, porém sagrados; Uma certa libertação; Para anunciar novamente o Cristo. ''
Sobre a Igreja
Pg.4 “ Enquanto for peregrina sobre esta terra , não tem a Igreja o direito de gloriar-se de si mesma”.
“ O concílio, diz ele, queria indicar a passagem de uma atitude de conservação a uma atitude missionária, muitos se esquecem de que o conceito conciliar oposto a “ conservador” não é “ progressista” mas “ missionário”.
“ Paulo II procurou convocar o Concílio de Trento, 1542, criou a Inquisição Romana e Universal” . Pg 11 . “ É o mesmo Evangelho que lembra que o homem não vive só de pão mas sobretudo de Palavra de Deus. Mas, essa Palavra mais indispensável do que o alimento, deve ser acolhida na sua autenticidade e preservada de qualquer alteração.”
Pg 12 “ A Igreja não é uma organização apenas humana, deve defender um propósito que não é seu, deve garantir o anúncio dele e a sua transmissão através de um magistério que o represente de modo adequado e autêntico aos homens de cada época.”
Pg 13 “ Chama-se heresia a negação obstinada após a recepção do batismo, de alguma verdade em que se deve crer por fé divina e católica, ou a dúvida obstinada sobre ela.”
“ O herege – juntamente com o apostata e o cismático- incorre na excomunhão Latae sententiae.”
“ A palavra da Escritura é atual para a Igreja de todos os tempos, assim como é sempre atual para o homem a possibilidade de cair em erro. Portanto, também hoje é atual a advertência da II Carta de Pedro, a cerca do cuidado com os falsos profetas e falsos mestres que introduzirão heresias perniciosas.”
“ Onde existe um laço eclesial um pouco mais forte, deparamos com um fenômeno diferente, porém ligado ao primeiro: eu fico cada vez mais admirado com a habilidade dos teólogos que conseguem defender justamente o oposto do que se encontra claramente escrito nos documentos do magistério. E no entretanto, aquelas deturpações são apresentadas através de hábeis artifícios dialéticos, como o “ verdadeiro” significado do documento em questão.”
Pg.16 “ É impossível para um católico tomar posição a favor do Concílio Vaticano II contra Trento ou o Concílio Vaticano I. Quem aceita o Concílio Vaticano II, assim como ele se expressou claramente na letra, e entendeu-lhe o espírito, afirma ao mesmo tempo a ininterrupta tradição da Igreja, em particular os dois Concílios precedentes. E isto deve valer para o chamado “ progressismo” pelo menos em suas formas extremas.”
“ Do mesmo modo, é impossível decidir-se a favor de Trento e do Concílio Vaticano I contra o Concílio Vaticano II . Quem nega o Concílio Vaticano II , nega a autoridade que sustenta os outros dois Concílios e dessa forma , os separa do seu fundamento.”
“ A própria história da Igreja, que só pode subsistir como uma unidade indivisível.”
“ Os papas e os padres conciliares, esperavam uma nova unidade católica, e, pelo contrário caminhou-se ao encontro de uma dissensão, Paulo VI, pareceu passar da autocrítica à auto destruição.”
Concílio Vaticano II
- Cardeal Julius Dö Pfener: “ A Igreja pós conciliar é uma grande obra de construção, mas um espírito crítico acrescentou que é uma obra de construção que se perdeu o projeto e cada um continua a fabricar de acordo com seu próprio gosto , o resultado é evidente.”
“ Estou convencido que os danos encontrados nestes últimos anos não são atribuídos ao Concílio “ verdadeiro”, mas aos desencadear-se , no interior da Igreja, de forças latentes agressivas , centrífugas, talvez irresponsáveis ou simplesmente ingênuas, de um otimismo fácil, de uma ênfase quanto à modernidade que confundiu o moderno progresso técnico com um progresso autêntico integral.”
“ Defender hoje a tradição verdadeira da Igreja, significa defender o Concílio. É também nossa culpa se alguma vez demos pré-texto para pensar que o Concílio Vaticano II tenha sido um ruptura, uma fratura, um abandono da tradição. É ao hoje da Igreja que devemos permanecer fiéis, não ao ontem, nem ao amanhã, e esse hoje da Igreja são os documentos o Concílio Vaticano II em sua autenticidade, sem reservas que os amputem. E sem arbítrios que os desfigurem.”
Pg.21 “ Já durante as sessões , e, a seguir cada vez sempre mais no período sucessivo, opô-se um auto-intitulado “espírito do Concílio” que na verdade é um verdadeiro “ anti-espírito”.”
“ Tudo o que é novo seria sempre, de qualquer forma, melhor do que já existiu ou existe. É o anti-espírito, segundo o qual se deveria começar a história da Igreja a partir do Concílio Vaticano II, visto como uma espécie de ponto de partida.”
“ Não existe uma Igreja “pré” ou “pós” conciliar, existe uma só e única Igreja, que caminha rumo ao Senhor, aprofundando sempre mais e compreendendo sempre melhor a bagagem da fé que Ele mesmo lhe confiou”.
“ Nesta história não existem saltos, na existem rupturas, não há solução de continuidade. O Concílio de modo algum pretendia introduzir uma divisão no tempo da Igreja.”
“ Quero dizer que o Vaticano II não pretendia certamente mudar a fé, e sim apresentá-la de modo mais eficaz.. O diálogo com o mundo só é possível quando baseado em uma identidade clara. A identidade firme é condição da abertura, mas se pensaram poder abrir-se a tudo o que era de positivo existir no mundo moderno, foi por que justamente estavam certos de sua própria identidade, estavam certos de sua fé. Enquanto por parte de muitos católicos houve nestes anos um escancarar-se ao mundo, isto é , a mentalidade moderna dominante, sem filtros, nem freios, pondo em discussão ao mesmo tempo, as bases mesmas do depositum fidei que, para muitos, não eram mais claras. O Vaticano II tinha razão em almejar uma revisão nas relações entre a Igreja e o mundo.”
Pg. 22 “ Não são os cristãos que se opõem ao mundo. É o mundo que se opõe a eles quando é proclamada a verdade sobre Deus, sobre Cristo e sobre o homem. O mundo revolta-se quando o pecado e a graça são chamados por seus próprios nomes.”
“ É tempo de o cristão reencontrar a consciência de pertencer a minora , de estar muitas vezes em oposição ao que é óbvio e natural para aquilo que o Novo Testamento chama – e certamente não em um sentido positivo – o espírito mundano. É tempo de reencontrar a coragem do anti-conformismo, a capacidade de se opor, de denunciar muitas das tendências da cultura que nos cerca, renunciar a certa e eufórica solidariedade pós-conciliar.”
Pg. 23 “ A Igreja caminha para frente, rumo à realização da história, olha adiante, para o Senhor que vem.”
- Cardeal John Henry Newman: “ O Concílio é sempre um risco para Igreja, que portanto, só deve convoca-lo para poucas coisas e não prolonga-lo por muito tempo.”
Pg. 25 “A releitura da letra do documentos poderá fazer-nos descobrir seu verdadeiro espírito.”
“ O católico que com lucidez vê os danos produzidos na sua Igreja pelas deformações do Vaticano II, nesse mesmo Vaticano II deve encontrar a possibilidade de recuperação . O Concílio é seu, e não daqueles que querem continuar em uma estrada cujos resultados foram catastróficos. Não é daqueles, que não por acaso, não sabem mais o que fazer com o Vaticano II, olhando-o como um fóssil da era clerical.”
“ A história da Igreja, que Deus guia através de percursos misteriosos, não se faz com os “se” devemos aceita-la como ela é.”
Pg. 26 “ O cardeal Otavianni, apoiava o projeto de um concílio ecumênco.”
“ É preciso reconhecer portanto, que o Concílio Vaticano II, desde o inicio, não tomou o rumo que João XXIII previa. E deve-se reconhecer que, pelo menos até agora, não foi atendida a prece do Papa João XXIII para que o Concílio significasse para a Igreja um novo salto à frente, uma vida, uma unidade renovadas.”
Pg. 27 * João Paulo II : “ A Igreja de hoje não precisa de novos reformadores. Ela tem necessidade de novos santos.”
“ É o aparecimento de novos movimentos que ninguém previu, mas que brotaram espontaneamente da vitalidade interior da fé mesma. Neles se manifesta , ainda que discretamente, algo como um período de pentecostes na Igreja.”
“ Refiro-me ao movimento carismático, aos cursilhos, ao movimento dos Focolares, às Comunidades Neo- Catecumenais, à Comunhão e Libertação, etc… certamente todos estes movimentos geram também alguns problemas, em medida maior ou menor, trazem também perigos, mas isso acontece em qualquer realidade viva.”
Pg.29 “ Algumas idéias eclesiológicas em vaga devem ser relacionadas, antes, como modelo de “certas Igrejas livres” da América do Norte, onde se refugiavam os crentes para fugir ao modelo opressivo de Igreja do Estado, produzido na Europa pela reforma. Aqueles pró-fugas, já não crendo em uma Igreja institucional querida por Cristo e desejando, ao mesmo tempo, fugir da Igreja Estado, criavam a sua Igreja, uma organização estruturada segundo às suas necessidades.”
Pág. 31 “ É preciso recriar um clima autenticamente católico, reencontrar o sentido da Igreja como Igreja do Senhor, como espaço da real presença de Deus no mundo. Aquele mistério de que fala o Concílio Vaticano II quando escreve estas palavras terrivelmente comprometedoras e que, no entanto, correspondem à toda tradição católica: “ A Igreja , isto é, o reino de Deus já presente em mistério”.
Pg.32 “ Mas a Igreja de Cristo não é um partido, não é uma associação e nem um clube: a sua estrutura profunda e ineliminável não é democrática, e sim sacramental, portanto hierárquica. Porque a hierarquia baseada na sucessão apostólica é condição indispensável para se alcançar a força e a realidade do sacramento. Aqui, a autoridade não se baseia em votações de maioria, baseia-se na autoridade do próprio Cristo, que quis fazê-la participada por homens que fossem seus representantes até seu retorno definitivo. Só poderá redescobrir a necessidade e a fecundidade católica da Igreja retomando essa visão de obediência e a sua legítima hierarquia.”
A fé da Igreja
Pg 33/34 – “A observação sobre a troca do “eu” por “nós” na oração da paz faz com que nós pessoalmente não assumamos nossas culpas, onde todos pecam e, no entanto, ao final das contas, ninguém parece ter pecado. A Igreja presumia que quem celebrasse a Eucaristia tinha necessidade de dizer: “ Eu pequei, não olhei Senhor, os meus pecados.” Era a invocação obrigatória para todos os sacerdotes, todos deveriam pronunciá-la em sua Missa cotidiana. E também leigos , todos os outros membros da Igreja eram chamados a se unir naquele reconhecimento de culpa.”
Pg. 35 – “ Fé que não é um ato individual, solitário, uma resposta ao individuo, mas que significa crer juntos, com toda Igreja.”
“ Devemos ter sempre presente que a Igreja não é nossa mas sua. Portanto as reforma, as renovações, embora sempre necessárias, não podem se resumir em um esforço zeloso de nossa parte para exigir novas e sofisticadas estruturas. Quero dizer com isso que o que podemos fazer é infinitamente inferior Àquele que faz.”
“ É verdade que os santos conheceram bem. Eles realmente reformaram a Igreja profundamente, não elaborando planos para novas estruturas, mas reformando-se a si mesmos.”
Sacramento da Reconciliação
Pg. 38 “ Sacramento a Reconciliação? Existem sacerdotes que tendem a transforma-lo quase que unicamente em uma forma de conversa, em uma espécie de auto análise terapêutica entre duas pessoas ao mesmo nível. É necessário que o padre aceite colocar-se em segundo plano, deixando espaço para Cristo, que, somente Ele, pode perdoar o pecado. É preciso também aqui, retornar ao conceito autêntico do sacramento, onde homens e mistério se encontram naquele momento, como aliás, na celebração de qualquer sacramento, o padre não recebe diretamente sua autoridade o consenso dos homens, mas diretamente de Cristo.”
“ Sinto me sempre mais desgostoso, quando ouço definir com superficialidade, como “esquemática” exterior, anônima, a maneira de se aproximar do confessionário que era muito difundida tempos atrás.”
Pg 39 “ E me parece sempre mais amargo o auto elogio que alguns padres fazem de seus
“ colóquios penitenciais”, feitos raros, mas, em compensação, bem mais pessoais, como eles dizem. Sem esquecer que , em tantas “ conversas” que se tornam analíticas demais, é humano insinuar-se uma espécie de complacência, uma auto absolvição que, na abundância das explicações, pode não deixar mais espaço para o sentido do pecado pessoal pelo qual, para além de todas as atenuantes, somos sempre responsáveis. É fora de dúvida que alguns homens, hoje, não conseguem mais aproximar-se do confessionário tradicional, enquanto a forma coloquial de confissão lhes abre realmente uma porta.”
Magistério
“ No Concílio Vaticano II, os padres tinham reconhecido a infalibilidade no magistério quando, como pastor e Doutor supremo, proclama que se deve ter como certa uma doutrina sobre a fé ou sobre os costumes criou-se desta forma um certo desequilíbrio em alguns autores de manuais de teologia, que não realçavam bastante que também o colégio episcopal goza da mesma infalibilidade no magistério, sempre que os bispos conservem o liame de comunhão entre eles e o sucessor de Pedro.”
Conferências Episcopais
Pg 40 – Pergunta: Tudo em ordem novamente , pois com o Concílio Vaticano II? “ Nos documentos sim, mas não na prática, na qual se deu um outro efeito paradoxal do pós-concílio, com efeito, explica: – A decidida retomada o papel do bispo, na realidade enfraqueceu-se um pouco, ou corre o risco de até ser sufocada pela inserção dos prelados em conferências episcopais sempre mais organizadas, com estruturas burocráticas, frequentemente pesadas. No entanto, não devemos esquecer que as conferências episcopais não possuem ordem teológica, não fazem parte da estrutura indispensável da Igreja, assim como querida por Cristo: têm somente uma função prática, concreta.
O Código de direito canônico, afirma que as conferências não podem agir validamente em nome de todos os bispos, a menos que todos e cada um dos bispos tenham dado o seu consentimento, e a menos que não se trate de matérias sobre as quais haja disposto o direito universal ou estabeleça um especial mandato da Sé Apostólica. O coletivo portanto não substitui a pessoa bispo, que como recorda o código, repetindo o concílio é o autêntico doutor e mestre da fé para os fiéis confiados aos seus cuidados.”
Pg 41 –“ Nenhuma conferência episcopal tem , enquanto tal, uma missão de ensino, seus documentos não têm valor específico, mas o valor do consenso que lhes é atribuído pelos bispos individualmente, o grupo dos bispos unidos nas conferências, dependem na prática, para decisões, de outros grupos, de comissões específicas, que elaboram roteiros preparatórios. Acontece que além disso, que a busca de um ponto em comum entre várias tendências e o esforço de mediação dão lugar muitas vezes, a documento nivelados por baixo, em que as posições precisas são atenuadas.”
Pg. 45 “ A fé, com efeito, é ameaçada de destruição sempre que a ciência eleva-se a si mesma como norma absoluta.”
Doutrina da Fé Cristã
Pg 49 “ Cada teólogo parece agora querer ser “ criativo” mas a sua tarefa autêntica é a de aprofundar, ajudar a compreender e anunciar o depósito comum a fé, e não a de criar caso contrário, a fé se fraciona com uma série de escolas e correntes frequentemente contraditórias, com grave prejuízo para o desorientado povo de Deus.”
“ Nessa visão subjetiva a teologia, o dogma é muitas vezes considerado como uma camisa de força intolerável, um atentado à liberdade do estudioso, individualmente considerado. Perdeu-se de vista o fato de que a definição dogmática é , ao contrário, um serviço de verdade, um dom oferecido aos crentes pela a autoridade querida por Deus.”
Pg.50 “ Alguns catecismos e muitos catequistas não ensinam mais a fé católica no seu conjunto harmônico, onde toda verdade pressupõe explica a outra, mas procuram tornar humanamente “interessantes” segundo a orientação cultural do momento.- certos elementos do patrimônio cristão, alguns textos bíblicos são selecionados porque são considerados mais próximos da sensibilidade contemporânea, outros, pelo motivo oposto, são deixados de lado. Portanto, não mais uma catequese que seja formação global para a fé, mas reflexões e temas de experiências antropológicas, parciais e subjetivas.”
“ Foi um primeiro e grave erro suprimir catecismo, declarando-o “ultrapassado”. O fato de ter sido uma decisão generalizada, nestes anos, não impede que tenha sido errônea ou, pelo menos, apressada.”
“ Todo discurso sobre a fé é organizado em torno de quatro elementos fundamentais: O Credo, O Pai Nosso, O Decálogo e os Sacramentos. É esta a base da vida do cristão, é esta a síntese do ensinamento da Igreja, baseado na Escritura e na Tradição. O cristão encontra neles aquilo no que deve crer ( O símbolo ou Credo ) esperar ( Pai Nosso ), fazer ( decálogo ) e o espaço virtual e vital em que tudo isso deve se realizar ( sacramentos ), ora, esta estrutura fundamental é abandonada em muita catequese de hoje com resultados , que constatamos, de segregação do sensus fidei nas novas gerações, muitas vezes incapazes de uma visão de conjunto de sua religião.”
Escritura
Pg. 51 “ O liame entre Bíblia e Igreja foi rompido. Esta separação foi iniciada há séculos no ambiente protestante e, recentemente, estendeu-se também entre os estudiosos católicos. A interpretação histórico-critica da Escritura abre, por certo, muitas e grandiosas possibilidades novas de compreensão do texto bíblico, mas ela por sua própria natureza, pode ilumina-lo apenas em sua própria natureza, pode ilumina-lo apenas em sua dimensão histórica, e não no seu valor atual. Se se esquece este limite, ela se torna não somente ilógica, mas também , justamente por isso, não científica. Esquece-se ainda que a Bíblia como mensagem para o presente e para o futuro, só pode ser compreendida em coligação vital com a Igreja. Acaba-se , dessa forma.lendo a Escritura não mais a partir do último método que se apresente como científico. Essa independência tornou-se, em alguns , até mesmo uma contraposição, tanto que a fé tradicional da Igreja , para muitos , já não parece mais justificada pela exegese crítica, mas , pelo contrário, torna-se um obstáculo à compreensão autêntica moderna do cristianismo.”
Pg.53 “ Todo católico deve ter a coragem de crer que a sua fé, em comunhão com a da Igreja, supera qualquer novo magistério dos peritos e dos intelectuais.”
Pg. 54 “ Além disso, a tendência de se pôr de lado o problema de Deus criador também porque se teme e, portanto, se quer evitar os problemas suscitados pela revelação entre fé na criação e ciências naturais, a começar pelas perspectivas abertas pelo evolucionismo. Assim, existem novos textos de catequese que não partem de Adão, do principio, do Gênesis, mas da vocação de Abraão ou do Êxodo, com efeito, parece mesmo que uma certa teologia não crê mais em um Deus que pode entrar nas profundezas da matéria. Daí a dúvida sobre os aspectos materiais da revelação, como a presença real de Cristo na Eucaristia, a virgindade Perpétua de Maria, a ressurreição dos corpos prometida para todos ao final da história. Não é por acaso que o símbolo dos apóstolo começa confessando “ Creio em Deus Pai, todo poderoso, criador de céu e da terra”. Esta é a fé primordial no Deus criador constitui como que o prego que sustenta todas as outras verdades cristãs. Se ele vacila, todo o resto cai”.
O pecado
Pg 55 “ A incapacidade de compreender e apresentar o pecado original é realmente um dos problemas mais grave da teologia e da pastoral atuais. O conceito chave de muitas das teologias de hoje é o conceito de “ libertação” que parece ter substituído o tradicional conceito de redenção.”
Matrimônio e sexualidade
Pg 60. “ Na cultura do mundo desenvolvido rompeu-se primeiramente o liame entre sexualidade e matrimônio. Separado do matrimônio , o sexo ficou deslocado, viu-se privado de pontos de referência : tornou-se uma espécie de mina vagante , um problema e, ao mesmo tempo um poder onipresente.
Realizada a separação entre sexualidade e matrimônio, a sexualidade foi destacada também a procriação. O movimento acabou, porém, tomando também um sentido inverso, isto é, procriação sem sexualidade.
Pg 62 – Eis portanto a árdua alternativa: ou a Igreja encontra um consenso, um compromisso com valores aceitos pela sociedade à qual deseja continuar servindo, ou decide permanecer fiel aos seus próprios valores e que, em sua opinião, são os que tutelam o homem nas suas exigências profundas, mas vendo-se então deslocada com relação à sociedade.”
Decálogo
Pg 64 – “ Existem hoje moralistas católicos que afirmam ser o decálogo, sobre o qual a Igreja constituiu a sua moral objetiva, um mero produto cultural ligado ao antigo oriente médio semita , volta aqui pois, a negação da unidade da Escritura, reaparecendo a antiga heresia que declarava o Antigo Testamento ( Lugar da Lei ) superado e rejeitado pelo Novo ( reino da graça ) mas, para o católico, a Bíblia é um todo unitário, as bem aventuranças de Jesus , não anulam o decálogo entregue por Deus a Moisés e, através dele, os homens de todos os tempos. Pelo contrário, segundo estes novos moralistas, nós, homens já adultos e liberados devemos procurar sozinhos outras normas de comportamento. Pg 66 O homem deseja continuamente apenas isto: Ser criador e o senhor de si mesmo, mas aquilo que o aguarda, ao final desta estrada , não é certamente , o paraíso terrestre.”
Mudanças
Pg 72 “ Em muitas casa religiosas, masculina e femininas a cruz cedeu seu lugar , muitas vezes, a símbolos das tradições religiosas asiáticas. Desapareceram também , em diversos lugares, as devoções de antes, para ceder lugar a técnicas de ioga ou zen.”
Pg. 79 “ Maria é aquela que não teme ficar ao pé da cruz , que como realça várias vezes o evangelista, conserva e medita em seu coração o que acontece ao seu redor, criatura da coragem e da obediência, é, hoje e sempre, um exemplo para o qual todo cristão, homem, mulher , pode e deve olhar.”
Pg. 81… “ Estando a Revelação encerrada em Jesus Cristo. Ele mesmo é a Revelação, mas certamente não podemos impedir Deus de falar a este nosso tempo, através de pessoas simples e também por meio de sinais extraordinários que denunciam a insuficiência das culturas que nos dominam , marcadas pelo racionalismo e pelo positivismo.”
Escatologia
Pg 86 “ O escatologismo radical e o mileranismo que caracterizam muitas dessas seitas podem avançar graças ao desaparecimento, em muitas pastorais, desse aspecto do autêntico catolicismo. Há nestas seitas uma sensibilidade ( que nelas é levada ao extremo, mas que na medida equilibrada, e autenticamente cristã , aos perigos do nosso tempo e, portanto, a uma possibilidade do fim eminente da história. A valorização correta de mensagens como a de a de Fátima poderia ser um nosso tipo de resposta: a Igreja, acolhendo a mensagem viva de Cristo, dada através de Maria a nosso tempo, sente a ameaça da ruína de cada um de todos, e responde pela penitência, pelo conversão decidida.”
Pg 87 “ Mas é preciso que isso seja demonstrado através de uma pedagogia catequética que habitue à leitura da Escritura na Igreja e com a Igreja.”
Liturgia
Pg. 90 “ A abertura da Liturgia às línguas populares era fundada e justificada: também o Concílio de Trento tinha –a presente, pelo menos a nível de possibilidade. Seria, pois, falso dizer, como certos integristas, que a criação de novos cânones para a Missa contradiz a Tradição da Igreja. No entanto, falta ainda ver até que ponto cada uma das etapas da reforma litúrgica, depois do Concílio Vaticano II, foram realmente melhorias e não, pelo contrário, banalizações, até que ponto foram pastoralmente sábias, e não, pelo contrário, tolas e temerárias. Juntamente com a simplificação e a formulação mais compreensível da liturgia, é claro que deve ser guardado também o mistério a ação de Deus na Igreja e, por isso, a fixação da substância litúrgica intocável pelos sacerdotes e pela comunidade, como também seu caráter plenamente eclesial. Portanto, devemos nos opor, mais decididamente do que tem sido feito até agora, ao nivelamento racionalista, aos discursos aproximativos do infantilismo pastoral, que degradam a liturgia católica à categoria de uma associação de aldeia e que querem rebaixar a liturgia católica ao nível de revista em quadrinhos. Mesmo as reformas já efetuadas, especialmente no que diz respeito do ritual, devem ser reexaminadas sob este ponto de vista.”
Pg.94 “ O que deve ser reencontrado plenamente é o caráter predeterminado, não arbitrário imperturbável, impassível do culto litúrgico por anos a fio. A liturgia não é um show, um espetáculo que necessite de diretores geniais e atores de talento. A liturgia não vive de surpresas simpáticas , de invenções cativantes, mas de repetições solenes. Não deve exprimir a atualidade e o seu efêmero, mas o mistério do sagrado. Muito pensaram e disseram que a liturgia deve ser feita por toda comunidade para ser realmente sua. É um modo de ver que levou a avaliar o seu sucesso em termos de eficácia espetacular, de entretenimento. Desse modo, porém, terminou por dispersar o proprium Litúrgico, que não deriva daquilo que nós fazemos, mas do fato de que acontece. Algo que todos nós fazemos juntos não podemos, de modo algum, fazer. Na liturgia age uma força, um poder que nem mesmo a Igreja inteira pode atribuir-se: o que nela se manifesta é o absolutamente o Outro que através da comunidade ( que não é portanto, dona, mas serva mero instrumento ) chega até nós. Para o católico, a liturgia é a Pátria comum, por isso ela deve ser pré-determinada, imperturbável, porque através do rito se manifesta a santidade de Deus.”
Pg 95 Sons e arte para o eterno
Muitos liturgistas puseram de lado esse tesouro, declarando-o “esotérico”, acessível a poucos, abandonaram-no em nome da compreensão por todos e em todos os momentos da liturgia pós-conciliar. Portanto, não mais música sacra, relegada quando muito a ocasiões especiais, as catedrais, mas somente música utilitária, canções, melodias fáceis, coisas corriqueiras.
Pg 96 Torna-se cada vez mais perceptível o pavoroso empobrecimento que se manifesta onde se expulsou a beleza, sujeitando-se apenas ao útil. Deixou-se de lado a grande música da Igreja em nome da participação ativa , mas esta participação não pode , talvez, significar também o perceber com o espírito, como os sentidos? Não existe nada de ativo no intuir, no perceber, no comover- se? Questionar tudo isso não significa, evidentemente, opor-se ao esforço para fazer cantar o povo, opor-se à música utilitária significa opor-se a um exclusivismo ( somente tal música ), nem justificando nem pelo Concílio, nem pelas necessidades pastorais.
A Igreja não pode se satisfazer apenas com o ordinário, com o usual, deve reavivar a voz do cosmos, glorificando o Criador e revelando ao próprio cosmos a sua magnificência tornando-o belo ( habitável e humano ).
Pg. 97 Se a Igreja , portanto, deve continuar a converter, a humanizar o mundo, como pode na sua liturgia, renunciar à beleza, que unida de forma inseparável ao amor e, ao mesmo tempo, ao esplendor da ressurreição? Não, os cristãos não devem se contentar facilmente, devem continuar fazendo de sua Igreja o lar do belo, portanto verdadeiro, sem o que o mundo se torna o primeiro círculo do inferno.”
Pg.98 Na realidade, a Igreja medieval, ou mesmo em certos casos, a Igreja barroca, realizou um aprofundamento litúrgico que é necessário avaliar com atenção antes de eliminá-lo. Também aqui também devemos respeitar a Lei Católica do sempre melhor e mais profundo conhecimento do patrimônio que nos foi confiado. O puro arcaísmo não serve, assim como não serve a mera modernização.
Pg. 99 A vida cultural do católico não pode ser reduzida apenas ao aspecto comunitário, nela deve continuar a existir também um lugar para a devoção privada, embora orientada para orar juntos, isto é, para a liturgia.
A liturgia para alguns, parece reduzir-se apenas à Eucaristia, visto sob o único aspecto de “ banquete fraterno”. Ms a Missa não é apenas refeição entre amigos reunidos para comemorar a Última Ceia do Senhor mediante a partilha do pão. A Missa é sacrifício comum da Igreja, no qual o Senhor ora conosco, por nós e a nós se dá. É a renovação sacramental do sacrifício de Cristo.
Se a Eucaristia é vivida apenas como banquete de uma comunidade de amigos, quem é excluído da recepção dos sagrados dons é realmente excluído da fraternidade. Mas, voltando-se a visão completa da Missa ( refeição fraterna e, ao mesmo tempo, sacrifício do Senhor que tem força e eficácia in se, para quem se une a Ele por fé ), então também quem não come desse pão participa igualmente, na sua media dos dons oferecidos a todos os outros.
Pg. 100 É o mesmo perigo que individualiza na diminuição da adoração diante do tabernáculo. Esqueceu-se , diz ele, que a adoração é um aprofundamento da comunhão. Não se trata de uma devoção individualista, mas do prosseguimento e da preparação do momento comunitário.
“ Penso em duas das mais ricas e fecundas orações do cristianismo que levam sempre e de novo à grande corrente eucaristica : a Via Sacra e o Rosário.”
Existência do demônio
Pg. 105 “ As proposições sobre o demônio são uma afirmação indiscutível da consciência cristã, se a existência de satanás e dos demônios nunca foi objeto de uma declaração dogmática é justamente porque esta parecia supérflua, sendo tal crença óbvia para a fé vivida que é a liturgia, que sempre insistiu na existência dos demônios e nas ameaças que eles constituem.
Pg. 106 Apesar do que dizem certos teólogos superficiais, o demônio é, para a fé cristã, uma presença misteriosa, mas real, pessoal , não simbólica. É uma realidade poderosa, o príncipe deste mundo, como o chama o Novo testamento, que mais de uma vez recorda a sua existência. É uma realidade maléfica e sobre-humana, oposta a Deus , como mostra uma leitura realista da história como o seu abismo de atrocidades sempre renovadas e não explicáveis apenas pelo homem.
Gaudium et Spes, 37 “ Toda história humana é atravessada por uma luta tremenda contra potências das trevas, luta iniciada desde a origem do mundo e que durará como diz o Senhor, até o último dia”.
Pg. 109 Os evangelistas falam muito dele e não têm de modo algum a intenção de faze-lo em sentido simbólico, como o próprio Jesus, estavam convencidos, e assim queriam ensinar, de que se trata de uma potência concreta, certamente não de uma abstração. O homem é por ela ameaçado e é dela libertado por obra de Cristo, porque só Ele na sua qualidade de mais forte, pode ligar o homem forte para usar as próprias palavras evangélicas”.
Pg. 111 Purgatório : “ O fato é que hoje todos nos julgamos de tal forma bons que só podemos merecer o paraíso. Há nisso a responsabilidade de uma cultura que, à força de atenuantes e álibis, tende a tirar dos homens a sua culpa, do seu pecado. Alguém observou que a ideologias dominantes são todas unidas por um comum dogma fundamental: a obstinada negação do pecado, isto é, exatamente aquela realidade de que a fé liga ao inferno e ao purgatório. Pg. 112 E eu digo que se o purgatório não existisse, seria preciso inventá-lo”.
Pg. 113 Indulgência: “ A catequese, porém não tem o direito de omiti-la”.
Pg.114 Demônios: “ Quem vê com lucidez os vórtices de nossa época, enxerga agindo neles potências que se esforçam para desaguar as relações entre os homens. O cristão pode não descobrir que sua função de exorcista deve readquirir aquela atualidade que teve nos inícios da fé”.
Pg. 117 Renovação carismática : “ É preciso antes de tudo, salvaguardar o equilíbrio, evitar uma ênfase exclusiva sobre o Espírito, que, como lembra o próprio Jesus, não fala por si mesmo, mas vive e age no interior da vida trinitária. Poderia levar a opor, a uma Igreja organizada sobre a hierarquia ( fundada, por sua vez, em Cristo ), uma outra Igreja , “ carismática”, baseada apenas na liberdade do Espírito, uma Igreja que se considere a si mesma como acontecimento sempre renovado, uma fé dogmática sem experiência pessoal permanece vazia. Uma mera experiência sem ligação como a fé da Igreja é cega. Enfim, não é o “nós” do grupo que conta, e sim o grande “nós” da grande Igreja Universal. Só esta pode fornecer o contexto adequado para não extinguir o Espírito e manter o que é bom, segundo a exortação apostólica”.
Além disto, para atingir os últimos recônditos dos riscos, é preciso precaver-se de um ecumenismo fácil demais, pelo qual grupos carismáticos católicos podem perder de vista a sua identidade e ligar-se de modo acrítico a formas de pentecolismos e origem não católica, em nome exatamente do Espírito, visto como oposto à instituição dos grupos católicos da renovação. No Espírito devem , pois, mais o que nunca agir sempre em comunhão com o bispo, também para evitar o risco cada vez que a Escritura é desenraizada do seu contexto comunitário: o fundamentalismo, o esoterismo e o sectarismo.
A Favor: Trata-se de uma esperança, de um positivo sinal dos tempos, de um dom de Deus à nossa época . É a redescoberta da alegria e da riqueza da oração contra teorias e práxis sempre mais enrijecidas e ressecadas do racionalismo secularizado.
Pg. 123 Protestantismo : “ Aquela obstinação do Sola Scriptura do protestantismo clássico não poderia sobreviver e hoje, mais do que nunca é posta em crise exatamente para a exegese científica que, nascida e desenvolvida em ambiente reformado, mostrou como os Evangelhos são um produto da Igreja Primitiva, mais ainda, como a Escritura inteira não é senão Tradição.
Para um reformado será sempre difícil , se não impossível, aceitar o sacerdócio como sacramento e como condição indispensável para a Eucaristia. Porque , para aceitar isso, ele teria que aceitar a estrutura da Igreja baseada na sucessão apostólica.
Pg.124– Igrejas Ortodoxas Orientais : Essas Igrejas possuem um ensinamento autêntico, mas estático, como que bloqueado, permanecem fiéis à tradição do primeiro milênio cristão, rejeitando todos ulteriores desenvolvimentos, porque teriam sido decididos pelos católicos sem eles, somente um concílio realmente ecumênico, portanto ampliado a todos cristãos, poderia, na opinião deles decidir em matéria de fé. Têm em comum conosco a noção da necessária sucessão apostólica, o seu episcopado e a sua eucaristia são autênticas. Não conseguem aceitar que o Bispo de Roma, o Papa, possa ser o princípio e o centro da unidade mesmo em uma Igreja Universal, entendida como comunhão.
Pg. 135 – Teologia da Libertação : 1- A teologia da Libertação é um fenômeno extraordinariamente complexo: pode abranger desde as posições mais radicalmente marxistas até aquelas que propõe o lugar apropriada necessária responsabilidade do cristão para com os pobres e os oprimidos no conceito do CEILAM, de Medelin e Puebla.
No presente texto usa-se o conceito teologia da libertação em um sentido mais restrito: um sentido que compreende apenas aqueles teólogos que de algum modo fazem própria a opção fundamental marxista mesmo que existam muitas diferenças entre uns e outros, e é impossível aprofunda-las nesta reflexão geral. Neste contexto, posso apenas tentar por em evidência algumas linhas fundamentais, que sem desconhecer suas diversas origens, são muito difundidas , exercendo uma certa influência mesmo onde não existe uma teologia da libertação em sentido estrito.
2-Com a análise do fenômeno da teologia da libertação torna-se patente um perigo fundamental para a fé da Igreja. Indubitavelmente, é preciso ter presente que um erro é tanto mais perigoso quanto maior for a proporção do núcleo de verdade que ele contém.
Além disso, o erro não poderia apropriar-se daquela parte de verdade se tal verdade fosse suficientemente vivida e testemunhada em seu lugar próprio, isto é, na fé da Igreja. Por isso, além de demonstrar o erro e o perigo da teologia da libertação, é preciso sempre acrescentar a pergunta: Que verdade se esconde sob o erro e como recupera-la plenamente?
3- A teologia da libertação é um fenômeno universal sob três pontos de vista:
a) Esta teologia não pretende constituir um novo tratado teológico ao lado dos outros já existentes, como por exemplo, elaborar novos aspectos da ética social da Igreja. Ela concede antes, uma hermenêutica da fé cristã, isto é, como uma nova forma de compreensão e de realização do cristianismo em sua totalidade. Por isso mesmo muda todas as formas da vida eclesial : a constituição eclesiástica, a liturgia, a catequese, as opções morais.
Pg. 136– b) A teologia da libertação tem certamente o seu centro de gravidade na América Latina, mas não é de modo algum um fenômeno exclusivamente latino-americano, não se pode concebê-la sem a influência determinante de teólogos europeus e também norte-americanos. Mas existe também na Índia, no Siri Lanka, nas Filipinas, em Taiwan, na África- embora nesta última predomine a busca de uma “teologia africana”. A união dos teólogos do terceiro mundo é fortemente marcada pela atenção prestada aos temas da teologia da libertação.
c) A teologia da libertação supera os limites confessionais. Ela procura criar, já desde as suas premissas, uma nova universidade, pela qual as separações clássicas entre as igrejas devem perder a sua importância.
1- Conceito e origem da teologia da libertação
O que é propriamente teologia da libertação? Em uma primeira tentativa de resposta, podemos dizer que a teologia da libertação pretende dar uma nova interpretação global do cristianismo: explicar o cristianismo como uma práxis de libertação e pretende consumir-se ela mesma,num guia para tal práxis. Mas, uma vez que segundo esta teologia, toda a realidade é política, também a libertação é um conceito político e o guia rum à libertação deve ser guia para ação política.
Nada permanece fora do empenho político. Tudo existe com uma colaboração política.- escreve textualmente um de seus principais representantes sul-americanos. Uma teologia que não seja prática, o que quer dizer essencialmente política, é considerada idealista e condenada como irreal ou como meio de conservação dos opressores no poder.
Para um teólogo que tenha aprendido a sua teologia na traição clássica e que tenha aceitado a sua vocação espiritual, é difícil imaginar que posso esvaziar seriamente a realidade global do cristianismo em um esquema de práxis sócio-politica de libertação. Isso, entretanto, é possível, já que os teólogos da libertação continuam a usar grande parte da linguagem ascética e dogmática da Igreja, mas em chave nova, de tal modo que quem lê ou escuta partindo de um outro fundamento pode ter a impressão de reencontrar o patrimônio antigo apenas com o acréscimo de algumas afirmações um pouco “ estranhas” mas que, unidos a tanta religiosidade não poderiam ser tão perigosas.
Precisamente a radicalidade da teologia da libertação faz com que sua gravidade não seja avaliada de modo suficiente , já que não se encaixa em nenhum esquema de heresia até hoje existente. A sua colocação , já de partida, situa-se fora dos tradicionais esquemas de discussão.
Por este motivo tentarei abordar a orientação fundamental da teologia da libertação em duas etapas: primeiramente, é necessário dizer algo sobre os pressupostos que a tornaram possível, a seguir, desejo aprofundar alguns conceitos básicos que permitem conhecer algo da estrutura da teologia da libertação.
Pergunta: Como se chegou a essa orientação totalmente nova e pensamento teológico, que se exprime na teologia da libertação? Vejo principalmente dois fatores que a tornaram possível:
1- Após o Concílio, produziu-se uma situação teológica nova:
A) Surgiu a opinião de que a tradição teológica existente até então, não era mais aceitável e que, por conseguinte, se devia procurar, a partir da Escritura e dos sinais dos tempos, orientações teológicas e espirituais totalmente novas.
B) A idéia de abertura ao muno e do compromisso com ele transformou-se em uma fé ingênua nas ciências, uma fé que acolheu as ciências humanas como um novo evangelho, sem querer reconhecer seus limites e problemas próprios. A psicologia, a sociologia e a interpretação marxista da história foram consideradas como cientificamente seguras e, portanto, como instâncias não mais contestáveis do pensamento cristão.
C) A critica da tradição por parte da exegese evangélica moderna, especialmente a de Rudof Bultimann e de sua escola, tornou-se uma instância teológica inamovível, que obstruiu a estrada às formas até então válidas da teologia, encorajando assim também novas construções.
2- Essa modificação da situação teológica coincidiu com uma modificação também na história espiritual . Ao final da teses de reconstrução após a II guerra mundial, fase que coincidiu pouco mais ou menos com o término do Concílio, produziu-se no mundo ocidental uma sensível falta de significado, à qual a filosofia existencialista, ainda em voga, não estava me condições de dar alguma resposta. Nesta situação, as diferentes formas do neo-marxismo transformaram-se em um impulso moral e, ao mesmo tempo, em uma promessa de significado que se mostra quase irresistível para a juventude universitária. O marxismo com acertos religiosos de Bloch e as filosofias providas de “ rigor científico” de Adorno, Hokheimer, Habemas e Marcuse, ofereceu modelos de ação com os quais se acreditou poder responder ao desafio da miséria no mundo e, ao mesmo tempo atualizar o sentido correto da mensagem bíblica.
3- O desafio moral da pobreza e da opressão não podia mais ser ignorado no momento em que a Europa e a América do Norte atingiam uma opulência até então desconhecida. Esse desafio exigia evidentemente novas respostas, que não podiam ser encontradas na tradição existente até aquele momento. A situação teológica e filosófica transformada até convidava expressamente a buscar a resposta em u cristianismo que se deixasse guiar pelos modelos de esperança das filosofias marxistas fundadas na aparência ,cientificamente.
II – A Estrutura Fundamental da Teologia da Libertação
Esta resposta se apresenta totalmente diversa nas formas particulares de teologia da libertação, teologia da revolução, teologia da política, etc… Não pode, pois, ser apresentada globalmente. Existiam , no entanto, alguns conceitos fundamentais que se repetem continuamente nas diferentes variantes e exprimem intenções fundamentais comuns.
Antes de passar a conceitos básicos do conteúdo, é necessário fazer uma observação acerca dos elementos estruturais que se sustentam a teologia da libertação. Para tal, podemos retomar o que já afirmamos acerca a modificação da situação teológica após o Concílio.
Como já disse, leu-se a exegese de Bultmann e de sua escola como um enunciado da ciência sobre Jesus, ciência que obviamente deveria ser considerada como válida. Porém há um abismo entre o Jesus histórico de Bultimann e o Cristo da fé ( O próprio Bultmann fala de Groben. Seguno Bultmann, Jesus pertence somente aos pressupostos do Novo Testamento, permanecendo porém encerrado no mundo do judaísmo).
Pg.139 O resultado final dessa exegese foi o questionamento da credibilidade histórica dos Evangelhos: o Cristo da tradição eclesial e o Jesus histórico, apresentado pela ciência, pertencem evidentemente a dois mundos diferentes. A figura de Jesus foi erradicada da sua colocação na tradição por ação da “ciência”, considerada com instância suprema, desse modo, devia-se procurar para a figura de Jesus uma nova interpretação e um novo significado. A importância de Bultmann, portanto , não está tanto em suas afirmações positivas, e sim no resultado negativo da sua crítica: o núcleo da fé , a cristologia, permaneceu aberto a novas interpretações, porque tinha desaparecido, como historicamente insustentáveis , aquelas que até então eram os seus enunciados originais. Ao mesmo tempo renegou-se o magistério da Igreja enquanto ligado a uma teoria cientificamente insustentável e, portanto, sem valor como instância cognoscitiva sobre Jesus. Os seus enunciados podiam ser considerados somente como definições frustradas de uma posição cientificamente superada.
Além disso, Bultmann foi importante para o desenvolvimento posterior de uma segunda palavra-chave. Ele trouxe à moda o antigo conceito de hermenêutica, conferindo-lhe uma dinâmica nova. Na palavra hermenêutica se expressa a idéia de que, para uma compreensão real dos textos históricos, não basta uma mera interpretação histórica, mas toda interpretação histórica inclui certas previsões prévias. A hermenêutica tem a função de atualizar a Escritura, em conexão com os dados que a história, sempre mutável, nos oferece: uma fusão dos horizontes do então e do hoje . Por conseguinte , ela suscita a pergunta : O que significa o então nos dias de hoje? O próprio Bultmann respondeu a esta pergunta servindo-se da filosofia de Heidegger e interpretou a Bíblia, desse modo, em sentido existencionalista. Tal resposta, hoje, não traz mais interesse algum, neste sentido, Bultmann foi superado pela exegese atual mas permaneceu a separação entre a figura de Jesus da tradição clássica e a idéia de que se possa e se deva transferir essa figura ao presente, através de uma hermenêutica. A análise marxista da história e da sociedade foi considerada como única com caráter científico. Isso significa que o mundo é interpretado à luz do esquema da luta de classes, e que a única escolha possível é entre o capitalismo e o marxismo. Significa além disso, que toda realidade é prática e deve ser justificada politicamente . O conceito bíblico de pobre oferece o ponto de partida para a confusão entre imagem bíblica da história e dialética marxista. Segundo esta compreensão , só existem e podem existir duas opções , portanto, contradizer esta interpretação da Bíblia não é senão expressão da classe dominante para conservar o próprio poder. Um teólogo da libertação afirma: “ A luta de classes é um dado da realidade e a neutralidade nesse ponto é absolutamente impossível”
A parir daí tornou-se impossível também a intervenção do magistério eclesiástico: se ele se opusesse a tal interpretação do cristianismo, estaria demonstrando apenas estar do lado dos ricos e dos dominadores, contra os pobres e sofredores, isto é, contra o próprio Jesus, na dialética da história, aliás se ia à parte negativa.
… A vivência e as experiências da comunidade determinam a compreensão e a interpretação da Escritura.
Outra vez pode-se dizer, de um modo rigorosamente científico na aparência que na figura de Jesus, apresentada nos Evangelhos, constitui uma síntese dos acontecimentos e de interpretação da experiência de comunidades particulares, em que, no entanto, a interpretação é muito mais importante do que o acontecimento, que, em si, não é mais determinável. Esta síntese primitiva de acontecimento e interpretação pode ser dissolvida ou reconstruída sempre de novo: a comunidade interpreta cm a sua experiência os acontecimentos e, desse modo, encontra a sua práxis.
Pg. 141 – Esta mesma idéia podemos encontrar um tanto modificada, no conceito de povo, com o qual se transformou em mito marxista a realidade do “povo de Deus”, tão acentuada no Concílio. As experiências do “povo” explicam a Escritura. “Povo” torna-se desta forma, um conceito oposto ao de “hierarquia” e em antítese a todas as instituições indicadas como forças de opressão. Finalmente, é o “povo” quem participa da “ luta de classes”, a “Igreja popular” se contrapõe à Igreja hierárquica. Por último a instância hermenêutica decisiva é o conceito de “história”. A opinião considerada cientificamente segura e irrefutável, de que a Bíblia raciocina exclusivamente em termos históricos de salvação, e portanto de maneira anti-metafísica, permite fusão do horizonte Bíblico com a idéia marxista da história, que procede dialeticamente como autentica revelação e, portanto, a verdadeira instância hermenêutica da interpretação bíblica. Tal dialética é apoiada, algumas vezes pela pneumatologia, isto é, pela concepção da ação do Espírito Santo.
Em todo caso , esta última vê uma instância inimiga no processo do magistério, que insiste em verdades permanentes, dado que pensa “metafisicamente” e assim contradiz a “história”. Pode-se dizer que o conceito de história observe o conceito de Deus e de revelação. A “historicidade” da Bíblia deve justificar o seu papel absolutamente predominante e, portanto, deve legitimar, ao mesmo tempo, a passagem para a filosofia materialista, na qual a história assumiu a função de Deus.
III- Conceitos Fundamentais da Teologia da Libertação
Com isso, chegamos aos conceitos fundamentais do conteúdo da nova interpretação do cristianismo. Uma vez que os contextos nos quais aparecem os diversos conceitos são diferentes, gostaria, sem prejuízo da sistemática, de citar alguns deles, comecemos pela nova interpretação da fé, da esperança e da caridade.
Com relação à fé, por exemplo, um teólogo sul-americano afirma: “ A experiência que Jesus tem de Deus é radicalmente histórica, sua fé converte-se em fidelidade.” Dessa forma, substitui-se fundamentalmente a fé pela “fidelidade à história”. Aqui se produz aquela fusão entre Deus e a história que possibilita conservar para Jesus a fórmula de Calcedônia, ainda que com um sentido completamente diferente. Pode-se ver como os critérios clássicos da ortodoxia não são aplicáveis à análise dessa teologia. Afirma-se que Jesus é Deus, porém, acrescenta-se imediatamente que “ Deus verdadeiro é somente Aquele que se revela histórica e escandalosamente em Jesus e nos pobres que continuam a sua presença. Somente quem mantém unidas essas duas afirmações é ortodoxo…”
A esperança é interpretada como “confiança no futuro” e como trabalho para o futuro, com isso ela é subordinada novamente ao predomínio de classes.
Amor consiste na opção pela luta pelos pobres, isto é, coincide com a opção pela luta de classes. Os teólogos da libertação sublinham fortemente diante do “falso universalismo”, a parcialidade e o caráter partidário da opção cristã; tomar partido é, segundo eles , requisito fundamental de uma correta hermenêutica dos testemunhos bíblicos. Na minha opinião, aqui se pode reconhecer muito claramente a mistura entre verdade fundamental do cristianismo e uma opção fundamental não cristã , que torna o conjunto tão sedutor. O sermão da montanha seria, na verdade, a opção pelos pobres feita por Deus.
O conceito fundamental da pregação de Jesus é realmente o “reino de Deus”. Esse mesmo conceito encontra-se também no núcleo das teologias da libertação, lido porém à luz da hermenêutica marxista segundo um desse teólogos, o reino não deve ser compreendido espiritual ou universalmente, no sentido de uma escatologia abstrata. Deve ser compreendido em forma partidária e voltado para a práxis. Somente a partir da práxis de Jesus, e não teoricamente, é possível definir mo que seja o “reino”, trabalhar sobre a realidade histórica que nos circunda para transforma-la no “reino de Deus”.
Aqui deve-se mencionar também a idéia fundamental de certa teologia pós-conciliar que impulsionou nessa direção. Foi defendido que, segundo o Concílio, se deveria superar todas as formas de dualismo: o dualismo de corpo e alma, de natural e sobrenatural, de imanência e transcendência, de presente e futuro. Após o desmantelamento desses presumidos dualismos, resta apenas a possibilidade de trabalhar por um reino que se realize nesta história e em sua realidade politico-econômica.
Mas justamente desta forma deixou-se de se trabalhar pelo homem de hoje e se começou a destruir o presente em favor de um futuro hipotético: assim, produziu-se imediatamente o verdadeiro dualismo.
Neste contexto, gostaria de mencionar também a interpretação, totalmente aberrante, da morte e da ressurreição, dada por um dos líderes da teologia da libertação contra concepções universalistas, ele estabelece que a ressurreição é, em primeiro lugar, uma esperança para aqueles que são crucificados e constituem a maioria dos homens. Todos aqueles milhões para os quais a injustiça estrutural se impõe como uma lenta crucificação. O crente, no entanto, participa do senhorio de Jesus sobre a história através da edificação do reino, isto é, na luta pela justiça e pela libertação integral, na transformação das estruturas injustas em estruturas mais humanas. Esse senhorio sobre a história é exercitado ao se repartir o gesto de Deus que ressuscita Jesus, isto é, dando novamente vida aos crucificados da história.
O homem assumiu assim o gesto de Deus, a transformação total da mensagem bíblica se manifesta aqui de maneira quase teológica, se se pensa em como se desenvolveu e se desenvolve ainda essa tentativa de imitação de Deus.
Gostaria de citar apenas algumas outras interpretações “ novas” dos conceitos bíblicos:
O Êxodo se transforma em uma imagem central da “história da salvação” ( o mistério pascal) é entendido como um gesto revolucionário e, portanto, a ( Eucaristia ) é interpretada como a festa da libertação no sentido de uma esperança político-messiânica de sua práxis. A palavra redenção é geralmente substituída por ( libertação), que por sua vez, é compreendida , no contexto da história e da luta de classes, como processo de libertação em marcha . Por fim, é fundamental também a acentuação da práxis: a verdade não deve ser compreendida em sentido metafísico, pois tratar-se-ia de “idealismo”. A verdade realiza-se na história e na práxis. A ação é a verdade. Por conseguinte também as idéias que levam à ação são, em última instância, intercambiáveis. A única coisa decisiva é a práxis.
A orto-práxis torna-se assim, a única ortodoxia.
Dessa forma, justifica-se um enorme afastamento dos textos bíblicos. A crítica histórica liberta da interpretação tradicional, que é considerada “não científica” com relação à tradição, atribui-se a importância ao máximo rigor científico na linha de Bultmann. Mas os conteúdos da Bíblia, determinados historicamente, não podem, por sua vez, ser vinculantes de um modo absoluto. O instrumento para a interpretação da fé não é , em última análise , a pesquisa histórica, experimentada na comunidade, isto é, nos grupos políticos.
Se quisermos fazer um julgamento global devemos dizer que, quando alguém procura compreender as opções fundamentais da teologia da libertação, não pode negar que o conjunto contenha uma lógica quase inatacável. Com as premissas da critica bíblica e da hermenêutica fundada na experiência, de um lado, e, de outro, da análise marxista da história conseguiu-se criar uma visão da globalidade do cristianismo que parece responder plenamente tanto às exigências da ciência como dos desafios morais dos nossos tempos. Portanto, impõe-se aos homens, de modo imediato, a tarefa de fazer do cristianismo um instrumento de transformação concreta do mundo, o que pareceria uni-lo a todas as forças progressistas de nossa época.
Pode-se , pois compreender como esta nova interpretação do cristianismo atrai sempre mais teólogos, sacerdotes e religiosos, especialmente no contexto dos problemas do terceiro mundo. Subtrair-se a ela deve necessariamente parecer, aos olhos deles, como uma evasão da realidade, como uma renúncia à razão e à moral. Porém, de outra parte, quando se pensa no quanto é radical a interpretação do cristianismo que dela deriva, torna-se ainda mais urgente o problema do que se possa e se deva fazer frente a ela. Superaremos essa crise somente se conseguirmos tornar visível a lógica da fé de um modo igualmente abrangente e apresenta-la na experiência vivida como lógica da realidade, isto é, como força real de uma resposta melhor. Exatamente porque as coisas estão assim ( isto é, exatamente porque pensamento e a experiência, reflexão e ação são solicitados em igual medida ), toda a Igreja é aqui interpelada. Não basta apenas a teologia, apenas o magistério não é o suficiente; uma vez que o fenômeno “teologia da libertação” indica uma carência de conversão na Igreja , em uma falta, nela, de radicalidade na fé. Somente um acréscimo de conversão e de fé fará possíveis e despertará as intuições teológicas e as decisões dos pastores que correspondam à gravidade do problema.